terça-feira, 6 de novembro de 2012

1903 - O VOO DOS IRMÃOS WRIGHT


O voo de doze segundos dos irmãos Orville e Wilbur Wright foi registrado para a posteridade em dezembro de 1903 pelo fotógrafo John T. Daniels. Famoso por ser o primeiro voo em território americano, o dia marcou a entrada desses dois mecânicos de bicicletas para a história mundial e terminou com os irmãos Wright conseguindo fazer seu projeto 1902 Glider planar por mais de um minuto.

As invenções que mudam o curso da história não costumam surgir da noite para o dia. São resultado do trabalho árduo de diversos inventores e cientistas, que preparam o terreno para uma descoberta revolucionária. Entretanto, o crédito costuma ir para apenas uma pessoa, que por inventividade, gênio ou até por sorte, acaba dando o passo decisivo. A ele ou ela estão garantidas todas as glórias. Às vezes, porém, é difícil determinar quem merece ter seu nome imortalizado. É o caso da disputa entre Alberto Santos Dumont e os irmãos Wilbur e Orville Wright. Santos Dumont é louvado como Pai da Aviação no Brasil. No resto do planeta, ele é um ilustre desconhecido: o título de desbravadores dos céus cabe aos Wright.

Mas, afinal, qual das datas está correta? Quem foi o inventor do avião?

Para tentar responder essas perguntas, é preciso voltar à virada do século 19 para o 20. “Dois grandes desafios se apresentavam com relação à conquista do ar: a dirigibilidade dos balões (ou seja, a capacidade de controlá-los) e o voo com aparelhos mais pesados do que o ar”, afirma o físico Henrique Lins de Barros, do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, em São Paulo. A partir de 1890, as experiências se multiplicaram em ambas as frentes. Havia muita expectativa, o problema é que não existia uma definição para o voo controlado, nem do balão nem do “aparelho mais pesado do que ar”.

Em 1898, foi criado o Aeroclube da França. Com o intuito de estimular a competição e ao mesmo tempo estabelecer marcos históricos definitivos, o Aeroclube criou prêmios que seguiam critérios básicos. Para a dirigibilidade dos balões, foi definido que a experiência seria pública, realizada diante de uma comissão oficial e com data marcada, para evitar que fatores como condições climáticas favorecessem algum concorrente. “Até então, a prática comum era levar um cientista de renome para observar a demonstração e escrever um parecer, mas os relatos eram subjetivos e carregados de emoção”, diz Henrique. Em outubro de 1901, o Prêmio Deutsch – oferecido pelo magnata do petróleo Henri Deutsch de la Meurthe, no valor de 50 mil francos – foi arrematado por Santos Dumont, após contornar a Torre Eiffel a bordo de um dirigível. Sua principal inovação foi acoplar um motor de combustão interna movido a gasolina a um balão de hidrogênio. Um a zero.

No entanto, definir o que seria um voo de avião seria um desafio bem maior. O assunto era polêmico, e muitas pessoas sequer acreditavam na possibilidade de algo mais pesado do que o ar levantar voo. A descrença era comum até a célebres cientistas. Em 1895, o físico e matemático britânico Lord Kelvin declarara que “máquinas voadoras mais pesadas que o ar são impossíveis”. A ciência, porém, avança contrariando o impossível, e homens cheios de imaginação se lançaram ao sonho de voar. O francês Clément Ader montou um aeroplano em forma de morcego, que chegou a perder contato com o chão, sem ganhar, no entanto, altitude. Samuel Langley, dos EUA, conseguiu fazer um pequeno modelo não tripulado voar. 

Entretanto, era Otto Lilienthal quem causava sensação na crítica especializada e de longe se tornara o preferido do público. Voando em planadores inspirados nos pássaros, o alemão mostrou que um voo eficiente era possível.

Para o Aeroclube francês, no entanto, planar não era o mesmo que voar. Ainda se discutiam os critérios para determinar o prêmio do primeiro voo de aparelho mais pesado do que o ar, quando, em 1903, chegou à Europa a notícia de que os Wright haviam realizado os primeiros voos controlados em um avião. Porém, a única evidência era um telegrama escrito pelos próprios irmãos, contando terem voado contra ventos de cerca de 40 quilômetros por hora. Nos dois anos seguintes, os rumores eram de que eles haviam percorrido distâncias cada vez maiores, chegando a impressionantes 39 quilômetros. Mas os irmãos não divulgavam uma foto sequer, e não permitiam que testemunhas neutras acompanhassem o experimento. Os franceses ignoraram o feito, por falta de provas concretas e também devido ao vento forte, que ajuda o avião a decolar.

Estabeleceu-se que o voo deveria ser feito com tempo calmo, e que o aparelho fosse capaz de alçar voo sem ajuda de elementos externos (o vento ou uma catapulta, por exemplo). Como no caso dos balões, a façanha deveria ser acompanhada por uma comissão oficial. E foi assim que, no dia 23 de outubro de 1906, foi realizado o primeiro voo homologado da história. Nos campos de Bagatelle, em Paris, na presença de juízes e de uma multidão de curiosos, Santos Dumont pilotou seu 14 Bis por exatos 60 metros, a uma altura entre 2 e 3 metros.

“O homem conquistou o ar!”, gritavam as pessoas em terra firme.

Pelo feito, o brasileiro recebeu prêmio de 3 mil francos oferecido por Ernest Archdeacon, um dos fundadores do Aeroclube. Menos de um mês depois, em 12 de novembro, ele voou ainda mais longe, 220 metros (a 6 metros de altura), batendo o próprio recorde.

Enquanto isso, os irmãos Wright mantinham segredo sobre sua invenção, apesar dos convites para que fossem demonstrá-la na Europa. Um dos motivos pelos quais os americanos se recusavam a participar dos eventos franceses era que seu avião, para decolar, usava uma catapulta, com um peso de 700 quilos que descia de uma torre e impulsionava o aparelho para o voo, algo totalmente fora do parâmetro dos europeus. Outra razão para mistério era o medo de que sua ideia fosse roubada.

Em 1904, a Feira Mundial de Saint Louis ofereceu prêmio para quem conseguisse voar, mas eles não compareceram. Em 1905 e 1906, tentaram vender o projeto da máquina voadora para o Ministério da Guerra dos EUA e depois para o governo francês, mas recusaram-se a fazer demonstrações e por isso o negócio não foi para frente.

A conduta dos Wright era bem diferente da de Santos Dumont, que publicava seus projetos. E ao contrário dos americanos, que consideravam sua invenção relativamente acabada, o brasileiro estava sempre testando novas engenhocas. Antes do 14 Bis, ele se esforçara para aperfeiçoar o dirigível. Até 1905, construiu mais oito aparelhos do tipo. Só então voltou-se para o desenvolvimento de uma máquina “mais pesada do que o ar”. O próprio Santos Dumont explicou mais tarde a razão da demora: “É que o inventor, como a natureza de Lineu, não faz saltos: progride de manso, evolui”. Ele sabia que a decolagem dependia de um motor potente, e enquanto não havia um, seguia explorando os balões.

Curiosamente, o primeiro projeto de Santos Dumont era parecido com um avião moderno, mas diferente dos aviões da época. Porém, devido às críticas, ele abandonou a ideia. A cautela estava ligada também a um evento que abalou os pioneiros da aviação: a morte de Otto Lilienthal, cujo avião se espatifou em 1896. O episódio lançou uma onda de medo entre os inventores.

Em 1908, os Wright finalmente levaram o Flyer para a Europa e apresentaram pela primeira vez as fotos do voo de 1903. A essa altura, todos estavam interessados nos recordes de distância, e os Wright, que de fato tinham desenvolvido melhor a parte de aerodinâmica e controle no ar, sabiam que, nesse ponto, poderiam se sair bem. Os americanos causaram sensação no Velho Mundo com voos de mais de 100 quilômetros. Tornada pública, sua invenção ajudou a impulsionar o desenvolvimento da aviação, que atingiria um marco com a travessia do Canal da Mancha (entre França e Inglaterra) pelo francês Louis Blériot, em 1909.
Na comparação, do ponto de vista aerodinâmico, o avião brasileiro sai perdendo. Mas há quem defenda que a aeronave dos Wright sequer possa ser considerada um avião. O que eles inventaram não passa de um planador motorizado. Muita gente se surpreende ao saber sobre a catapulta.

A polêmica está cercada de ufanismo, e é provável que jamais possamos dizer com certeza quem foi o primeiro homem a voar. Porém, há um fato curioso. Quase 100 anos depois do feito de Santos Dumont, o 14 Bis voltou a ganhar os céus. Ou quase: trata-se de uma réplica, construída pelo coronel paulista Danilo Flôres Fuchs, que pilotou seu avião diversas vezes, inclusive uma em São Paulo, em 1989, e outra em Paris, em 1991. “Ele é bastante estável e é possível atingir distâncias maiores de 1 quilômetro”, diz Fuchs. Nos EUA, sonha-se fazer o mesmo com o Flyer. Existe até uma fundação, a Discovery of Flight Foundation, que se dedica a estudar a façanha dos Wright, construindo réplicas e tentando fazê-las voar. Até hoje, não conseguiram.

O voo do Flyer 1 é reconhecido nos Estados Unidos e pela Fédération Aéronautique Internationale como o primeiro de um aparelho voador controlado, "mais pesado que o ar".
Apesar do reconhecimento, há polêmicas quanto a ser o voo do Flyer 1, o primeiro controlado, mas diferente de outros engenhos anteriores ao Flyer 1, que também foram controlados, não houve auxilio mecânico na decolagem. A aeronave não se elevou ao ar por meios próprios, isto é, com auxílio de equipamento de lançamento como rampa e trilho. O mesmo voo foi efetuado em condições de limitação do percurso, com a distância de voo só alcançada em conformidade com a potência de lançamento da máquina auxiliar. O voo ocorreu com a presença de testemunhas, como o presidente do banco da cidade e alguns funcionários públicos, caracterizando portanto um evento com credibilidade pública, quase semelhante ao voo do 14-Bis de Santos Dumont, em que especialistas, jornalistas e milhares de pessoas presenciaram o fato.

Em 1904, Santos-Dumont recebeu a notícia que, nos Estados Unidos, os irmãos Orville e Wilbur Wright afirmavam ter conseguido voar em 1903 com um aeroplano mais pesado que o ar. No entanto, esse voo foi realizado sem a presença de uma comissão científica e de qualquer testemunha. Seu único registro foram publicações nos jornais com base nos relatos dos próprios aviadores.

Posteriormente, o voo de 1903 foi aceito publicamente, mas com um caráter de dependência de recursos externos ao aparelho. Como o motor de 12 HP era insuficiente para elevar o aeroplano do solo, decolaram com auxílio de catapulta.
Somente em 1908, dois anos após o vôo do 14-Bis, Wilbur Wright esteve na França para realizar demonstrações, mostrando publicamente a superioridade do aparelho em relação a todos os que estavam sendo produzidos na Europa. Alegou que esse avião fora construído com base no modelo original de 1903.

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