A Guerra de Canudos ou Campanha de Canudo foi o confronto entre o Exército Brasileiro e os integrantes de um movimento popular de fundo sócio-religioso liderado por Antônio Conselheiro, que durou de 1896 a 1897, na então comunidade de Canudos, no interior do estado da Bahia, no nordeste do Brasil.
A região, historicamente caracterizada por latifúndios improdutivos, secas cíclicas e desemprego crônico, passava por uma grave crise econômica e social. Milhares de sertanejos e ex-escravos partiram para Canudos, cidadela liderada pelo peregrino Antônio Conselheiro, unidos na crença numa salvação milagrosa que pouparia os humildes habitantes do sertão dos flagelos do clima e da exclusão econômica e social.
Os grandes fazendeiros da região, unindo-se à Igreja, iniciaram um forte grupo de pressão junto à República recém-instaurada, pedindo que fossem tomadas providências contra Antônio Conselheiro e seus seguidores. Criaram-se rumores de que Canudos se armava para atacar cidades vizinhas e partir em direção à capital para depor o governo republicano e reinstalar a Monarquia.
Apesar de não haver nenhuma prova para estes rumores, o Exército foi mandado para Canudos. Três expedições militares contra Canudos saíram derrotadas, o que apavorou a opinião pública, que acabou exigindo a destruição do arraial, dando legitimidade ao massacre de até vinte mil sertanejos. Além disso, estima-se que cinco mil militares tenham morrido. A guerra terminou com a destruição total de Canudos, a degola de muitos prisioneiros de guerra, e o incêndio de todas as casas do arraial.
Antônio Vicente Mendes Maciel, apelidado de "Antônio
Conselheiro", nasceu em Quixeramobim (CE) a 13 de março de 1830. Foi
comerciante, professor e advogado prático nos sertões de Ipu e Sobral. Após sua
esposa tê-lo abandonado em favor de um sargento da força pública, passou a
vagar pelos sertões em uma andança de vinte e cinco anos. Chegou a Canudos em
1893, tornando-se líder do arraial e atraindo milhares de pessoas. Acreditava
que a República, recém-implantada no país, era a materialização do reino do
Anti-Cristo na Terra, uma vez que o governo eleito seria uma profanação da
autoridade da Igreja Católica para legitimar os governantes. A cobrança de
impostos efetuada de forma violenta, a celebração do casamento civil e a
separação entre Igreja e Estado eram provas cabais da proximidade do "fim
do mundo".
O governo da República recém-instaurada precisava de dinheiro para
materializar seus planos, e só se fazia presente no Sertão pela cobrança de
impostos. A escravidão havia acabado poucos anos antes no país, e pelas
estradas e sertões, grupos de ex-escravos vagavam, excluídos do acesso à terra
e com reduzidas oportunidades de trabalho. Assim como os caboclos sertanejos,
essa gente paupérrima agrupou-se em torno do discurso do peregrino Antônio
Conselheiro, acreditando que ele poderia libertá-los da situação de extrema
pobreza ou garantir-lhes a salvação eterna na outra vida.
O episódio que desencadeia a Guerra de Canudos ocorreu em outubro de
1896. Antônio Conselheiro havia encomendado uma remessa de madeira, vinda de
Juazeiro, para a construção da igreja nova, mas a madeira não foi entregue,
apesar de ter sido paga. Surgem então rumores de que os conselheiristas iriam
buscar a madeira à força, o que leva as autoridades de Juazeiro a enviar um
pedido de assistência ao governo estadual baiano, que manda um destacamento
policial de cem praças, sob comando do Tenente Manuel da Silva Pires Ferreira.
Após vários dias de espera em Juazeiro, vendo que o rumor era falso, o destacamento
policial decide partir em direção a Canudos, em 24 de novembro. Mas a tropa é
surpreendida durante a madrugada em Uauá pelos seguidores de Antônio
Conselheiro, que estavam sob o comando de Pajeú e João Abade. Vinham como quem
vinha para reza, ou para a guerra. Foram recebidos a bala pelos sentinelas
semi-adormecidos e surpresos. Era a guerra.
A pacata Uauá transformava-se em violento território de combate. O
Tenente Pires Ferreira descreve o ataque destacando a "incrível
ferocidade" dos assaltantes e a forma pouco convencional como organizavam
suas manobras, isto é, usando apitos. A celeridade e a rapidez com que a luta
se deu propiciou vantagem inicial aos conselheiristas. Adentraram ao arraial
onde ocuparam algumas casas. A lógica, entretanto, prevaleceu. Armados e
municiados com equipamentos mais modernos e letais, os soldados do 9º Batalhão
de Infantaria impuseram pesadas baixas as forças belomontenses. A crueza do
combate foi inegável, sendo que o uso de armas como "facões de
folha-larga, chuços de vaqueiro, ferrões ou guiadas de três metros de
comprimentos, foices, varapaus e forquilhas utilizados em lutas de corpo a
corpo produziam cenas dantescas. Foram entre 4 e 5 horas de pânico, sangue,
horror e gestos de bravura e pânico. Contabilizadas as baixas de ambas facções,
os números determinavam a vitória militar das tropas governamentais. No
relatório oficial, Pires Ferreira informa que pereceram na batalha, dentre as
hostes conselheiristas "cento e cinquenta, fora os feridos".
Passadas várias horas de combate, os canudenses, comandados por João
Abade, resolveram se retirar, deixando para trás um quadro desolador. Apesar da
aparente vitória, a expedição estava derrotada, pois não tinha mais forças nem
coragem para atacar Canudos. Naquela mesma tarde, saqueou e incendiou Uauá e
retornou para Juazeiro, com o saldo de 10 mortos (um oficial, sete soldados e
os dois guias) e 17 feridos. Estas perdas, embora consideradas
"insignificantes quanto ao número" nas palavras do comandante,
ocasionaram a retirada das tropas.
A segunda expedição
Janeiro de 1897 - Enquanto aguardavam uma nova investida do governo, os
jagunços fortificavam os acessos ao arraial. Comandada pelo major Febrônio de
Brito, depois de atravessar a serra do Cambaio, uma segunda expedição militar
contra Canudos foi atacada no dia 18 e repelida com pesadas baixas pelos
conselheiristas, que se abasteciam com as armas abandonadas ou tomadas à tropa.
Os sertanejos mostravam grande coragem e habilidade militar, enquanto Antônio
Conselheiro ocupava-se da esfera civil e religiosa.
A terceira expedição
Março de 1897 - Na capital do país, diante das perdas e a pressão de
políticos florianistas que viam em Canudos um perigoso foco monarquista, o
governo federal assumiu a repressão, preparando a primeira expedição regular,
cujo comando confiou ao coronel Antônio Moreira César, considerado pelos
militares um herói do exército brasileiro, e popularmente conhecido como
"corta-cabeças" por ter mandado executar mais de cem pessoas a sangue
frio na repressão à Revolução Federalista em Santa Catarina. A notícia da
chegada de tropas militares à região atraiu para lá grande número de pessoas,
que partiam de várias áreas do Nordeste em defesa do "homem Santo".
Em 2 de março, depois de ter sofrido pesadas baixas, causadas pela guerra de
guerrilhas na travessia das serras, a força, que inicialmente se compunha de
1.300 homens, assaltou o arraial. Moreira César foi morto em combate, tendo o
comando sido passado para o coronel Pedro Nunes Batista Ferreira Tamarindo, que
também tombou no mesmo dia. Abalada, a expedição foi obrigada a retroceder.
Entre os chefes militares sertanejos destacaram-se Pajeú, Pedrão, que depois
comandou os conselheiristas na travessia de Cocorobó, Joaquim Macambira e João
Abade, braço direito de Antônio Conselheiro, que comandou os jagunços em Uauá.
A quarta expedição
Abril de 1897 - No Rio de Janeiro, a repercussão da derrota foi enorme,
principalmente porque se atribuía ao Conselheiro a intenção de restaurar a
monarquia. Jornais monarquistas foram empastelados e Gentil José de Castro,
gerente de dois deles, assassinado. Em abril de 1897, o ministro da Guerra,
marechal Carlos Machado Bittencourt preparou uma expedição, sob o comando do
general Artur Oscar de Andrade Guimarães, composta de duas colunas, comandadas
pelos generais João da Silva Barbosa e Cláudio do Amaral Savaget, ambas com
mais de quatro mil soldados equipados com as mais modernas armas da época.
Junho de 1897 - O primeiro combate verificou-se em Cocorobó, em 25 de
junho, com a coluna Savaget. No dia 27, depois de sofrerem perdas
consideráveis, os atacantes chegaram a Canudos. Durante os primeiros meses, as
tropas conseguem pouco resultado. Os sertanejos estão bem armados com armas
abandonadas pela expedição anterior, e o exército não tem a infraestrutura
necessária para alimentar suas tropas, que passam fome.
Agosto de 1897 - O próprio ministro da Guerra, marechal Carlos Machado
Bittencourt, seguiu para o sertão baiano e se instalou em Monte Santo, com o
intuito de colocar um fim ao caos em que estava o abastecimento das tropas.
Monte Santo se torna base das operações.
Setembro de 1897 - Após várias batalhas, a tropa conseguiu fechar o
cerco sobre o arraial. Antônio Conselheiro morreu em 22 de setembro,
supostamente em decorrência de uma disenteria. Após receber promessas de que a
República lhes garantiria a vida, uma parte da população sobrevivente se rendeu
com bandeira branca, enquanto um último reduto resistia na praça central do
povoado. Apesar das promessas, todos os homens presos, e também grupos de
mulheres e crianças, acabaram sendo degolados - uma execução sumária que se
apelidou de "gravata vermelha". Com isto, a Guerra de Canudos acabou
se constituindo num dos maiores crimes já praticados em território brasileiro.
Outubro de 1897 - O arraial resistiu até 5 de outubro de 1897, quando
morreram os quatro derradeiros defensores. O cadáver de Antônio Conselheiro foi
exumado e sua cabeça decepada a faca. No dia 6, quando o arraial foi arrasado e
incendiado, o Exército registrou ter contado 5.200 casebres.
Resultado
O conflito de Canudos mobilizou aproximadamente doze mil soldados
oriundos de dezessete estados brasileiros, distribuídos em quatro expedições
militares. Em 1897, na quarta incursão, os militares incendiaram o arraial,
mataram grande parte da população e degolaram centenas de prisioneiros.
Estima-se que morreram ao todo por volta de 25 mil pessoas, culminando com a
destruição total da povoação.
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